O Movimento Municípios Sustentáveis, iniciado em agosto deste ano, com a participação de municípios da região Norte e Noroeste mato-grossense, começa a desenhar a construção de observatórios sociais da gestão pública local e regional (veja mais em Movimento Municípios Sustentáveis: sociedade civil se reúne para discutir a formação de Observatório Social da Gestão Pública Municipal). Para isso, as experiências já em curso em outras localidades do país incentivam estes cidadãos, que buscam uma gestão pública participativa e a qualidade de vida. Para falar deste processo, o Instituto Centro de Vida (ICV) entrevistou Renato Morgado, integrante do Observatório Cidadão de Piracicaba, que é coordenador de políticas públicas do Imaflora. 55d1y
Por Sucena Shkrada Resk/ICV
ICV – Renato, conte a história do Observatório Cidadão de Piracicaba:
Renato Morgado – Um dos marcos da fundação foi a Conferência Nacional de Transparência e Controle Social, no ano de 2011. Várias instituições e pessoas da cidade participaram e percebemos que este trabalho na etapa municipal era necessário para avançar nos instrumentos de participação, de acompanhar o poder público de forma permanente. Era uma demanda que continuava. Parte das instituições que fazem hoje parte do Observatório, apesar de atuar em áreas diferentes (ambiental, direitos humanos, religiosa, educacional e entre outras), tinha pontos em comuns de objetivos, de avançar a transparência, a capacidade de acompanhar o que a Prefeitura e vereadores fazem. Ao mesmo tempo despertou esse interesse e permitiu que as instituições se conhecessem e continuássemos a atuar no controle social.
ICV – Vocês se inspiraram em algum modelo de observatório já existente?
Renato Morgado – A escolha do formato foi o modelo de observatório inspirado em movimentos da Rede Brasileira de Cidades Justas e Sustentáveis, que trabalham especialmente em três grandes linhas de ações – por meio de monitoramento com indicadores de órgãos e políticas públicas, de forma permanente; contribuir para a melhoria das políticas públicas; de educação para a cidadania e controle social, com palestras, minicursos e materiais educativos. No processo, reproduzimos e adaptamos algumas iniciativas e inovamos com outras ações.
ICV – Como é a forma de participação dos integrantes do Observatório?
Renato Morgado – Cada instituição indica uma secretaria executiva que se reúne mensalmente ou bimestralmente para discutir as questões do observatório mais estratégicas. Qualquer relatório a ser divulgado a por este grupo. Funciona como um conselho diretor. A produção de análises é feita por algumas pessoas vinculadas a estas instituições ou voluntários e vamos atualizando os indicadores. Definimos o que queremos monitorar: transparência, participação e meio ambiente. Aí triamos as métricas e relatórios. Demonstramos o estado como o município está, além de sugestões de soluções. Não temos uma sede própria e atuamos em nossos próprios escritórios na tarefas diárias e em locais itinerantes, nos encontros.
ICV – Por favor, cite um exemplo de trabalho desenvolvido:
Renato Morgado – O Observatório produziu um boletim de análise das audiências públicas, em que foram levantados os horários, quantidade de pessoas, onde eram feitos os encontros, quais eram os temas tratados e quem havia convocado. É uma forma de raios-x deste instrumento importante de participação que o poder público tem obrigação de promover para tomar algumas decisões. Também fizemos uma proposta como deveria ser organizada a audiência, desde a fase anterior de divulgação e mobilização à convocação até a prestação de contas do poder público. Sugerimos que fossem realizadas no período noturno ou aos sábados, algo que foi aceito, para possibilitar a maior participação dos cidadãos. Outro boletim tratou de mobilidade urbana, quanto a mortes no trânsito, ampliação de ciclovias, circulação de automóveis e como o poder poderia atuar nesta área.
ICV – Qual contribuição relevante do Observatório em cinco anos de vida que você considera que pode ser visualizada pela sociedade?
Renato Morgado – As mudanças não ocorrem de forma instantânea. Como é uma iniciativa que quer fazer uma mudança cultural de relação da sociedade com o poder público, é preciso ser algo permanente. A cada seis meses fazemos um boletim de transparência dos poderes públicos municipais. Mais recentemente vimos as alterações. Temos uma preocupação que haja essas mudanças.
ICV – Como o Observatório teceu as redes de relações de contatos para o diálogo com o poder público?
Renato Morgado – Fazemos reuniões com prefeitos, secretários, vereadores e diretores na Câmara, quanto aos resultados dos boletins, para ter um diálogo fluído, antes da divulgação a público. Esta interlocução é importante para entender o ponto de vista do poder público quanto ao tema e manter um diálogo qualificado.
ICV – Como vocês constituem os indicadores?
Renato Morgado – Alguns já estão consolidados, como a geração de resíduo por dia, que é a relação de consumo controlada pela própria prefeitura, na balança do aterro. Dados sobre veículos, por exemplo, com o Departamento Nacional de Trânsito (Denatran). Reorganizamos esta informação ou geramos, como foi do mapeamento das audiências e a constituição também 20 indicadores sobre as atividades da Câmara, com um formato mais fácil de leitura.
ICV – Quais são os seus canais de comunicação?
Renato Morgado – Site, facebook e e-mail. Qualquer produto e atividade do Observatório também é divulgado para os meios de comunicação da cidade, por meio de um release. Acaba dando repercussão. Também promovemos palestras e oficinas em escolas, faculdades e centros comunitários, fizemos mais de cinco minicursos (sobre como funciona o orçamento público e como participar da política da gestão urbana da cidade). Pensamos os temas e oferecemos a proposta a um público variado, desde estudante até funcionários públicos.
ICV – Como manter com vigor um observatório formado basicamente com voluntários?
Renato Morgado – Por dois anos funcionamos com financiamento da Fundação Caterpillar, com equipe remunerada. Isso permitiu que desenvolvêssemos uma série de coisas, como métodos, site, além da participação dos voluntários das instituições e apoio parcial da Unesp e da USP. Hoje o nosso tempo de dedicação é menor. O que vejo como algo interessante é que o observatório tenha um recurso pequeno para manter pelo menos uma pessoa remunerada, que disponibilize um tempo de dedicação maior. Isto não impede que seja totalmente voluntário (como ocorre hoje conosco). O vigor está relacionado à construção da cidade que a gente quer. O observatório é um instrumento poderoso de transformação. Enquanto cidadãos, temos papel enorme a contribuir para a melhoria da cidade, das políticas públicas, que vai muito além do voto. Agrega a cidadania dispersa para transformar em algo concreto.
ICV – Quais são os meios de recursos que vocês consideram melhor para terem sua independência?
Renato Morgado – A questão da sustentabilidade financeira é um desafio para todos. Um modelo interessante é que os próprios atores locais possam manter as iniciativas. Uma mescla de pessoas físicas com associações e empresas. Acho que isto mostra que a comunidade local apoia. Mas há outros modelos também possíveis e devem ser pensados desde o desenho do observatório até a demanda de tempo de dedicação das pessoas.
ICV – Quais foram as principais conquistas que observaram ao longo destes anos?
Renato Morgado – Sem dúvida, o avanço da transparência da Prefeitura e da Câmara, eu atribuo em parte, à atuação do Observatório. Todo órgão público tem a obrigação de disponibilizar as informações em portais de transparência e serviço de informação de cidadão que responda informações e documentos em até 20 dias, mas esses os eram mais morosos. A questão da audiência pública é pontual, mas a mudança de horário em resposta ao nosso levantamento foi importante. Na questão de resíduos sólidos, nossa incidência auxiliou para que a Prefeitura fizesse o Plano Municipal de Gestão dos Resíduos Sólidos bastante robusto. Agora a cidade tem uma estação de tratamento e aterro sanitário. Uma conquista difícil de medir, mas fundamental, é saber que pessoas que aram por nossas oficinas e cursos, participam de forma mais qualificada no monitoramento da gestão públicas. O papel dos observatórios como agentes educadores para o controle social é bem positivo. Temos o mito grande de que brasileiro não gosta de participar desses espaços, mas sempre tivemos grande demanda nas nossas atividades. Quando as pessoas são estimuladas, dão retorno.
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